António tinha conhecido Beatriz no litoral alentejano. Lá onde o mar marca compasso e as rochas celebram história. Avistou-a num vestido cinza, naquela tarde de Agosto. Os cabelos castanhos dançavam-foi a sinestesia emancipada da vida, aquele momento o seu-quando a viu. Foram juntos para a vila. Dois estranhos, não fosse ela o ver todas as manhãs a entrar na mercearia por detrás da sua casa. As primeiras palavras trocaram-se-tens tabaco? António arregalou os olhos, tirou uma guantanamera do bolso- roubada do gavetão do escritório do pai- e em jeito de troca apresentou-se.
O resto que se poderia seguir em jeito de literatura florida não acrescenta muito ao que foi aquele verão. Tinha-se gostado na roda inocente do que é o amor- Havia tardes que se espreguiçavam ao sol na manta branca da avó Deolinda, corriam no trigo dos campos a norte, sentavam-se no banco junto à falésia e ficavam a ouvir o mar. Davam as mãos em tom de brincadeira na calçada da rua grande…Ela costumava cheirar-lhe o pescoço, beijar-lhe o ombro e esperar um sorriso na volta. Na volta.
Era na casa da avó Deolinda que as roupas saltavam dos corpos no desejo alucinado e sôfrego dos vinte. Beatriz tirava a roupa e António ficava a olhar para ela-nua com os raios da luz, definidos pela persiana, a baterem-lhe no corpo. Cantarolava e rodopiava em bicos de pés e António lá a puxava para si beijando-lhe a barriga. Beatriz sorria de cócegas e caia na cama.
Talvez nenhum deles soubesse que era amor.
(Um caderno antigo)